sexta-feira, 26 de junho de 2009

Anjos

Faz alguns anos eu deixei de acreditar em religiões. Pra ser mais exato, desde que comecei a perceber que o sentido original de religião havia se perdido, que a hipocrisia havia dominado a fé, e igrejas passaram a ser empresas multinacionais de arrecadação de doações. Mas isso é assunto pra outro texto, o importante agora é salientar que deixei de acreditar nas religiões, não em Deus. Não deixei de acreditar na existência do divino, algo superior a todos nós, manifestando-se de diferentes formas, sempre de maneira sutil, as vezes nem percebida. E hoje quero me deter à uma forma específica de manifestação de Deus, o chamado "anjo da guarda". Dizem que todos temos um, que você não precisa nem acreditar nele, ele simplesmente esta ali, ao seu lado, e você não vai percebê-lo. A menos que queira. Sim, porque, como eu disse, ele se manifesta de diferentes formas. Ele pode ter sido aquele seu colega que se mostrou na verdade um grande amigo, quando você menos esperava e mais precisou de um. Por que não? Onde está escrito que seu anjo da guarda tem que ter asas, usar fralda e carregar uma harpa? Eu prefiro acreditar que não. Prefiro acreditar até que ele não se restringe a apenas uma figura, podendo ser varias, dependendo da situação. Ele poderia ser o seu cão, que não te deixou sozinho durante uma fase de depressão. Sem pular no seu colo, sem fazer festa. Simplesmente estava lá, ao seu lado. E você sabe o quanto precisava dele ali... Há pessoas que nos fazem bem simplesmente por existirem em nossa vida, mesmo estando distante fisicamente e próximos apenas em pensamento, ainda assim nos trazem a tranqüilidade de um porto seguro, apoio de valor inestimável em momentos de solidão. Então você pensa: "Que sorte ter conhecido alguém assim!". Sorte? Com certeza seus caminhos se cruzaram na hora certa, porque alguém (Ele) quis assim. E talvez você seja o anjo da guarda dessa pessoa, mesmo sem saber. Um telefonema, uma palavra de apoio, uma mão que é estendida à alguém que não a espera, gestos tão simples, por vezes tomados por insignificantes, mas dignos de um verdadeiro anjo da guarda. Anjos sem asas. E sem harpas. É preciso enxergar a presença do divino nisso. Nunca estamos sozinhos, alguém sempre olha por nós.

Há Mil Tons








"Sempre quiz fazer um auto-retrato, mas perco o foco... não me enquadro, sempre me corto... minha luz se apaga para fotômetros automáticos, estouro ou não apareço... obturadores tentam me pegar depois que passei... desisti! Coloquei espelho no porta-retrato pra poder me ver... ele quase sempre ri... suspeito... de mim!"
Auto Retrato - Hamilton Fialho

"Há Mil Tons"



"Di-Dá-Dó"





Não vejo o trabalho do Hamilton como o trabalho de um fotógrafo, mas sim como o de um poeta. Suas obras ultrapassam o conceito de simples registros de imagens. Poderia dizer que ele consegue capturar uma realidade alternativa, um mundo fantástico que nós não podemos ver, mas esta afirmação estaria incorreta. Hamilton tem o dom de perceber e capturar um mundo fantástico sim, mas é algo que na verdade existe, algo que está lá, ao alcance dos olhos de qualquer um, e simplesmente passa despercebido por nós. Seus trabalhos realizados em shows e peças de teatro (que na minha opinião são suas melhores obras, a exemplo de "Luzes da Canção", seleção de fotos de diversos espetáculos) conseguem transmitir a emoção, o movimento, a música através de imagens, muitas vezes tornando-se uma atração a parte, uma continuação do evento. Seus trabalhos não são editados, não há efeitos de flash nem de Photoshop, nada além das luzes locais e sombras. É puramente o que vemos, ou deveríamos ver, transformado em poesia. Um mundo comum, visto pelos olhos de um poeta.



"Alucinações"



Conheci o Hamilton em 2006, quando tive a oportunidade de trabalhar/aprender com ele na área de automação industrial. Seu humor sarcástico, sua postura constantemente crítica e altamente ética, conhecimento e bom gosto pelas artes em geral, começaram a me chamar atenção, e em pouco tempo passamos de colegas de trabalho a bons amigos. Acredito que tenha algo à ver com a tal afinidade.






"Cello´s"





Link para Hamilton:

segunda-feira, 15 de junho de 2009

The Rain Man

Dia de chuva hoje. Mais um. E justamente hoje estou sem o celular (perdi inexplicavelmente), então precisei sair pra dar um telefonema de um orelhão. Duas quadras e eu já estava encharcado, como se o guarda-chuva adiantasse pra alguma coisa mesmo além de manter a cabeça seca. Na volta, após o telefonema, já com o mau humor tomando conta da sensatez, parei em um boteco enquanto esperava a melhor oportunidade para atravessar a rua, quando uns meninos passaram brincando e um deles pulou na poça a minha frente... Bom, respirei fundo e segurei minha primeira reação, que seria a de chutar o moleque pro outro lado da rua (hehe, sorry). Olhei novamente as crianças, brincando. Brincando na chuva. Me senti envergonhado. Quantas vezes fiz isso. E como era divertido. E quando deixei de fazer? Não lembro, nem por que deixei de fazer. Mas era divertido. Um dia de chuva não precisa ser um dia ruim, nem um dia de folga como o de hoje. Em algum lugar algum agricultor está feliz, amanha seus campos estarão bem mais vivos. Alguém deve estar assistindo a uns DVDs bem acompanhado debaixo do edredon (hum, com pizza e coca-cola...), ou tomando banho de chuva mesmo, brincando, correndo, pulando. Fechei os olhos pra ouvir a chuva, mas o barulho do transito tornou esse momento impossível. Bom, a companhia me falta, mas lembrei que devem haver pelo menos uns 15 DVDs que ainda estão até lacrados la em casa, não assisti a nenhum dos que comprei nos últimos meses. Fechei o guarda-chuva, aproveitei o sinal aberto para pedestres e voltei pra casa. Dessa vez a passos curtos, e sem me preocupar em desviar das poças.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Adeus à um amigo

Nunca fui uma pessoa muito popular, nunca vivi rodeado de amigos, a maioria foi ficando pelo caminho. Alguns fui perdendo contato aos poucos, alguns reencontrei via Orkut, muito raros os que me acompanham desde a infância. Conseqüência de puro relaxamento meu, já que não costumo procurá-los o tempo todo. Sempre achei que me bastava saber que eles estavam lá, bem, em algum lugar. Que se eu quisesse (ou eles quisessem), era só pegar o telefone e ligar, marcar alguma coisa e pronto, a gente se via, botava o assunto em dia, coisa e tal. Hoje percebi o tamanho do meu erro. A gente nunca sabe o dia de amanhã. A gente não sabe nem o dia de hoje. Tratamos certos assuntos como se nunca fossem acontecer conosco. Ou com alguém que conhecemos. A verdade é que nossa permanência aqui é temporária, e é difícil não se esquecer disso. E é difícil não esquecer, porque é difícil aceitar que temos que nos separar definitivamente de alguém de quem gostamos. É diferente de viver longe de uma pessoa, mas saber que ela esta bem e em um lugar que você pode visitá-la quando quiser. E devido a essa frustração dos que ficam, tratamos a morte como um castigo – equivocadamente - quando pensamos, “putz, com tanta gente ruim nesse mundo, morre alguém que nunca fez mal a ninguém”. E aqui cabe um esclarecimento de alguém que entende disso muito mais do que eu: “A morte não é um castigo, é uma passagem, uma libertação. Os que ficam, esses sim ainda tem assuntos pendentes a resolver e, enquanto isso, ficam presos a esse corpo material. Os que fazem a passagem, na verdade se libertam dos sofrimentos e limitações físicas que permanecem apenas aqui”. Bom, é mais fácil escrever sobre isso do que aceitar. O fato é que hoje eu perdi um amigo. Inesperadamente. Alguém que eu achei que me bastava saber que estava bem, em algum lugar, e que eu poderia procurá-lo quando quisesse. Não procurei, nem ao menos uma ligação pra dizer que lebrei dele. Perdi a oportunidade de saber se ele realmente estava bem, de assistir ao jogo do Grêmio juntos comendo pipoca, de tomar chimarrão falando bobagem. Coisas tão simples, que ficaram definitivamente pra trás. Com certeza agora ele está bem melhor do que eu, do que nós, e bem melhor do que ele próprio estava antes. Enquanto isso, eu, juntamente com os que permanecem aqui, ficamos com as boas recordações, um coração apertado pela saudade, e a esperança de um dia nos reencontrarmos todos novamente, em algum lugar, numa grande festa.

Fica em paz tio Deco.

"Aqueles que passam por nós não vão sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós".
Antoine de Saint-Exupery